quarta-feira, 18 de abril de 2012

Candomblé em portugal: SOU YAÔ… E AGORA?


SOU YAÔ… E AGORA?

Para todos aqueles que decidam, pela dor ou pelo amor, abraçar a vida espiritual tendo como veiculo o Candomblé, os primeiros tempos são obrigatoriamente vividos numa amalgama de sentimentos e emoções. A entrada num determinado terreiro é acompanhada pela necessária e fundamental dúvida sobre se realmente é aquele o local que irá proporcionar o crescimento desejado e, mais importante ainda, se será aquele Pai ou Mãe de Santo que será entendido como capaz e merecedor de colocar a sua mão sobre o Ori.
Depois de atingida essa certeza e de se ter em consciência escolhido permanecer na casa que nos acolheu, independentemente do caminho de cada um, seguem-se uma sucessão de múltiplas escolhas que, tal como bifurcações num caminho, terão obrigatoriamente que ser feitas.
A mais importante de todas as escolhas, e que culmina o período descrito, é sem dúvida a de escolher se se deverá ou não avançar para a iniciação. E é esta a mais importante das escolhas porque nada na vida de quem decide fazer a sua primeira obrigação tornará a ser como dantes! Pelo menos, assim deveria ser. A partir do instante que alguém “faz o Santo”, tem a obrigação de honrar e respeitar Olorum, os Òrisàs, o seu Pai ou Mãe de santo e cada um dos seres humanos que cruza o seu caminho, sem qualquer tipo de reservas. Essa pessoa passa a ser pertença do Òrisà, e deverá a toda a hora ser um veiculo de transmissão dos seus ensinamentos.
È esta a jura secreta que cada um faz com o dono/a do seu Ori quando se torna Yaô.
Ora pois bem, é aqui muitas vezes que reside o problema. Esta é uma tarefa exigente e de extrema responsabilidade. Embora nenhum Yaô possa em consciência dizer que cumpre escrupulosamente e sem falhas este desígnio, é obrigação de cada um lutar humildemente para detectar as suas falhas e erros, trabalhando para os minimizar e corrigir.
E nem é difícil começar a faze-lo…. Em primeiro lugar, urge compreender e aceitar que o facto de ser Yaô não acarreta poder nem supremacia. Acarreta antes sim mais responsabilidade e obrigações, mais humildade e sacrifício. Perante Olorum e os Òrisàs em todos os aspectos, mas também, de forma mais terrena e palpável perante o seu Pai ou Mãe de Santo. Alguém nos merecerá mais respeito do que quem zela por nós? Apenas o Pai ou Mãe de Santo está na posse de todos os dados da equação. Apenas o Pai ou Mãe de Santo conhece cada um dos seus filhos ao pormenor, e sabe, através das intuições divinas que lhe são concedidas, o melhor para cada um deles. Yâo que não aceite esta premissa, não é digno do Urukó que carrega.
Os esforços que os zeladores fazem diariamente, muitas das vezes sem conhecimento dos beneficiários, para o bem estar e crescimento de cada filho terão e deverão ser reconhecidos. Mais, deverão ser revestidos de um manto de gratidão a toda a prova. Gratidão essa que deverá ser demonstrada não em grandes discursos de exibicionismo, mas em acções palpáveis de respeito e seriedade.
De que vale bater a cabeça e dizer obrigado, se por trás se divide e semeia a dúvida e a desconfiança? De que vale ofertar o Pai ou Mãe de Santo com o mais bonito e valioso dos presentes, se depois se desdiz e critica o irmão só porque pensa e é diferente? Não teremos todos direito à nossa individualidade e liberdade, desde que não colida com a do próximo?
Com que moral, alguém que proceda assim, poderá agradecer ao seu Santo e pedir ajuda para as suas coisas? Qual o móbil de alguém que apenas pretende desdizer?
È esta a obrigação do Yaô. Lutar para unir, respeitando todos e cada um. Nunca o contrário. Até porque se assim o fizer, que exemplo dará aos mais novos, que estão na fase das dúvidas pela qual o próprio Yaô já passou?
Para que não restem dúvidas, atacar outro ser humano, qualquer que seja a forma do ataque, é atacar de forma directa Deus, os Orisás e o seu Pai ou Mãe de Santo . Sem excepções. Nem que seja com um simples olhar de desdém, ou com uma palavra de desapreço.
Yaô que assim proceda, dificilmente servirá de recipiente para receber condignamente a energia do seu Òrisà num Siré.
Fazer Santo porque é moda, nunca deu bom resultado. Em vez de progredir, quem o faz regride. Humana e espiritualmente. Antes de se escolher o caminho da iniciação, é necessário ponderar os prós e os contras, aferir dos direitos e dos deveres. Dever-se-à ter consciência que ninguém é perfeito ( porque se o fosse seria Òrisà em vez de humano), mas que é sempre possível melhorar. E que nunca é tarde para o fazer.
Depois, basta ter fé e pedir ajuda. Pedir a Olorum que guie o seu caminho, nas rotas de Ògún e sempre na luz branca de Osálá.
Porque é esse o caminho do Santo. È esse o caminho de Deus e como tal, deveria ser o caminho de cada um.

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