sexta-feira, 16 de março de 2012

Entrevista a Obarayi de Xangô (Balbino Daniel de Paula)


Balbino Daniel de Paula, mais conhecido como Obarayn D’Xangô, nasceu em Ponta de Areia na Ilha de Itaparica, ligado á família de grande líder religioso, Alapini Pedro Daniel de Paula, em memória Ojé do Terreiro Lesen Egun Aboulá.
Obarayn é figura ilustre entre as autoridades dos candomblés de nação Ketu e consequentemente, de todos os cultos Afro-Brasileiros, querida pela sua representatividade e irreverência, respeitada pela sua capacidade, autoridade e sabedoria no que diz respeito à destreza nas obrigações da religião na Bahia, no Brasil e no mundo.

A trajetória de uma pessoa de Ponta de Areia na Ilha de Itaparica, ligada ao culto de babá-egun à posição de extrema responsabilidade e visibilidade na liderança de um terreiro como pai-de-santo com inúmeros filhos de santo em Salvador, no Brasil e também no exterior pode parecer pouco comum. Mas ela se explica pela ligação ancestral de Balbino com a sua cultura de origem e as amizades e contatos com pessoas dos mais diversos contextos sociais e culturais que o destino lhe proveu. E ela torna-se ainda mais evidente pelo grande carisma da sua personalidade e pela sua força espiritual que se sente, sempre de novo, ao ver o seu Xangô, admirado pelos seus irmãos e filhos de santo.

Quando foi iniciado em 1959, a sua mãe-de-santo, Mãe Senhora do Ilê Axé Opô Afonjá, tinha comemorado alguns meses antes as bodas de ouro, por coincidência no dia de aniversário de Pierre Fatumbi Verger (4/11). Fatumbi era muito ligado a Mãe Senhora e mais tarde a Balbino, ao ponto de ser uma das pessoas responsáveis pela criação e instalação do terreiro Ilê Axé Opô Aganju, no Alto da Vila Praiana, em Lauro de Freitas.
Obarayn D’Xangô possui laços familiares de Santo em Portugal, por intermédio do Agabá e do Otún Orisá Ilé Asè Omin Ògún. Tanto o Bábálórísá Jomar d’Ògún como o Bábálórísá Paulo d’Yemonjá foram adoptados por Jacilewá (Bábálórísá Aristides Masacarenhas de Ajagunã, ou como é conhecido pelo povo de Santo, Pai Ari de Ajagunã, Òmó Òrísá de Obarayn) tornando-se assim Òmó (filhos) Ilê Asé Opô Ajagunã e, consequentemente, netos de Santo de Balbino Daniel de Paula. Bábálórísá Paulo d’Yemonjá, inclusivé, deu o seu Odun Enjé e Oyê de Bábálórísá com Pai Ari d’Ajagunã, reforçando este vinculo.

Nas próximas linhas, transcreve-se a entrevista dada por Obarayn á revista Povo de Santo e Asé, conduzida por Pai Ari de Ajagunã.

Aristides Mascarenhas – Em que ano o senhor se iniciou na Religião de Matriz Africana na Bahia?
Balbino Obarayin – Em 1958, quando conheci a Yalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá, Maria Bibiana do Espírito Santo: Mãe Senhora.
A.M – O Senhor foi o primeiro filho de santo, do sexo masculino iniciado naquele Terreiro?
B.O – Sim, eu fui o primeiro filho de santo do sexo masculino de mãe Senhora e meu irmão Moacir de Ogum, que já faleceu, foi o segundo,.
A.M – Em que ano foi fundado o Ilé Asè Opô Aganjú?
B.O – Em 1972 – foi fundado o Ilê Axé Opô Aganjú, em Lauro de Freitas, sendo o Terreiro da linhagem tradicional de Ketu, saído do Ilê Axé Opô Afonjá, a minha Matriz.
A.M – Qual a ligação do Terreiro aos terreiros da Casa Branca e do Gantois?
B.O – São minhas o matrizes; o primeiro Terreiro de Candomblé da Bahia – Terreiro chama-se Yá Nosso Oká, conhecido como Terreiro da Casa Branca, o 2º Terreiro é o do Gantois e o 3º o Axé Opô Afonjá. São as casas matrizes.
A.M – O senhor foi o fundador do grupo dos Mogbás na Bahia?
B.O – Sim, em 1972, foram criados os 12 ministros de Xangô, sendo que no Ilê Axé Opô Afonjá minha avó Aninha criou o grupo dos Obás e no Aganju o dos Mogbás.
A.M – No Aganjú tem um memorial do Escritor Pierre Vergê?
B.O – Sim, temos uma Casa, em espécie de Memorial do meu amigo, filho, pai Mogbá D’Xangô Pierre Vergê, onde estão expostos objetos de uso pessoal do Etnólogo.
A.M – Como o senhor é fiel à tradição de solidariedade social no Terreiro?
B.O – No Aganju, mantemos uma Creche (Casulo Vovó Ana), que atende gratuitamente 50 crianças do Alto da Vila Paiana, administrada por minha irmã biológica Rosa D’Oxum – Mãe Pequena da Casa (Yakekerê) filha de santo de Mãe Senhora também.



A.M – Porque a Creche tem o nome de Ana?
B.O – Porque Ana é o nome de minha saudosa mãe, filha de Oyá uma pessoa muita especial para a nossa família. Esta foi uma forma de a homenagear.
A.M – Qual foi o Seu primeiro contato com o Candomblé?
B.O – No ano de 1948, conheci o pai de santo, de Oxalá chamado seu Vidal; eu iria fazer meu santo com ele mas não cheguei a fazer por que ele faleceu em 1958. Então fui para São Gonçalo e fiz a minha obrigação com Mãe Senhora.
A.M – O que o Senhor aprendeu no Candomblé?
B.O – Aprendi a sobreviver, com essas mulheres guerreiras; aprendi sabedoria, coisas de Axé, uma vida de grande conhecimento com a minha saudosa Mãe Senhora.
A.M – O que falta no Candomblé?
B.O – Hoje existem algumas informações e pouca formação; todos querem ser pais e mães de santo antes do tempo e sem o aprendizado do Awô – Segredo.
A.M – O futuro de Obarayn, qual é?
B.O – Nas mãos dos meus orixás, meus ancestrais, eu não me pertenço estou na Mão de Xangô.
A.M – Referencias do Candomblé?
B.O – Mãe Stella, Mãe Tatá, Mãe Carne, Ebomi Rosa de Oxum, meus filhos de santo, meus Mogbás… felizmente, Eu amo muita gente.



A.M – Fale-nos de Saudade.
B.O – Minha Mãe de Santo, mãe Senhora, minha irmã biológica Ana, meu Pai Pedro, meu irmão Moacy de Ogum, minha Sofia de Oyá e outros.
A.M – Quais os Cargos dados pelo Babalorixá?
B.O – Dei vários (Oyê) – meus primeiros filhos a receber Deká no Ilê Axé Opô Aganju, foram Ailton Santos em memória Babakekerê da Casa, meu filho Jasilewá Aristides Mascarenhas, recebeu também o posto de Asoju Obá Laio da Casa de Xangô; outros cargos dados foram a Egbomi Nininha de Oxoguiã Otum Orixá, Egbomi Sisi de Oxalufã Otum Kekerê, Piedade de Oxalá Yá Efun.
A.M – Quantos dos seus filhos de santo, possuem Casas abertas como Terreiros.
B.O – Já perdi a conta… tenho filhos de santo até aqui mesmo em Lauro de Freitas como Casa aberta – Tide de Ajagunã tem até o Terreiro dele Tombado igual ao meu, Mãe Lila de Oxum, Omindaréwá e outros.
A.M – Deixe por favor, uma mensagem para o Povo de Santo.
B.O – Nós não precisamos buscar as nossas tradições, nas outras religiões, porque nós temos a força da natureza e somos livres para acreditar no nosso verdadeiro segredo (Awô).

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